Do ponto de vista social, a crise tem um nome: desemprego. Mais famílias são atingidas pela falta de trabalho.

As estatísticas, sempre zelosas em nos dar uma fotografia sobre diferentes prismas laborais, nada informam sobre a incidência familiar do desemprego. É que aqui não se trata de uma mera aritmética de somar desempregados. São diferentes as situações das famílias com um desempregado ou com os dois cônjuges desempregados e com filhos. A própria protecção social deveria aprofundar esta "modulação familiar".

Em Portugal, a crise veio antecipar as consequências das fragilidades estruturais de muitas empresas. Ajudadas, anteriormente, por políticas administrativas e cambiais, não souberam ou puderam criar os meios para enfrentar o aumento da incerteza e da concorrência, o imperativo da qualificação como factor-chave da produtividade e competitividade, a deslocalização e disseminação dos mercados ou a transversalização das novas tecnologias.

Por sua vez, as forças sindicais, mais preocupadas com os empregados e a defesa de direitos do que com os que não têm emprego, não acompanharam as novas formas de produção e organização do trabalho, a necessidade de maior flexibilidade laboral, a radical alteração da geografia das profissões, e o surgimento de formas de trabalho não enquadráveis na definição clássica de assalariado.

Como é facilmente verificável, o desemprego atinge quase indiferenciadamente a população activa. Uns, perdendo emprego; outros, prolongando o desemprego; outros ainda, não conseguindo o primeiro emprego; e, por fim, os que regressam ao país por deixarem de ter trabalho fora.

Entre os primeiros o risco é maior nas actividades sujeitas a forte concorrência externa ou em sectores que vinham apenas adiando a morte anunciada. Entre os segundos a dificuldade de reentrar no mercado de trabalho aumenta para os mais velhos (que são 27% dos desempregados) ou para os desempregados há mais de um ano que são já 52% do total. Entre os terceiros é preocupante a situação dos jovens com habilitações superiores (cerca de 60.000) que não conseguem emprego compatível. A todos estes acrescem os que, desencorajados, deixam de procurar emprego, passando estatisticamente de desempregados a inactivos.

No curto-prazo sabemos que é enorme a dificuldade económica em prevenir ou contrariar esta tendência. Já no domínio da protecção social e das políticas activas de emprego deve agir-se rapidamente. O Governo tomou algumas iniciativas (anunciadas 5 vezes como se fossem novas!), apesar de alguma cosmética de medidas já existentes ou da manifesta ineficácia de outras já antes testadas. Mas mais se deve fazer. Situações excepcionais exigem respostas excepcionais, ainda que transitórias.

Não pode haver momento mais desadequado para a entrada em vigor das alterações ao Código do Trabalho no que diz respeito ao agravamento generalizado da TSU em 3% para os contratos a termo (já de si discutível). É que nos próximos tempos rigidificar a contratação a termo é um erro, pois que - goste-se ou não - vai ser esta a forma mais previsível e flexível de se poder gerar algum emprego. Nestes tempos mais vale um trabalho a termo do que nada.

No plano da protecção social, e a título excepcional e transitório, defendo entre outras as seguintes medidas:
a) bonificação do subsídio de desemprego quando ocorre mais do que uma situação sem trabalho na mesma família e variável em função do número de filhos;
b) redução de 60 para 58 anos da idade de acesso à pensão de velhice sem penalização para os desempregados que tenham esgotado os períodos dos subsídios de desemprego e garantidas as exigências em vigor (repondo a norma de 2003);
c) aumento dos mecanismos de bonificação do subsídio de desemprego parcial;
d) Redução (transitória) do período de tempo necessário (prazo de garantia) para se aceder ao subsídio de desemprego de maneira a aumentar a baixa cobertura dos desempregados; e) adopção da figura de "reforma parcial" prevista na lei da Segurança Social revogada pelo executivo.

Se há fundos para salvar bancos e outras instituições, torna-se imperativo que haja dinheiro para acorrer a situações socialmente difíceis. No desemprego, antes dos números, estão as pessoas. O desemprego é um assunto de gente. Logo de dignidade humana.


António Bagão Félix, Economista, publicado no Diário Económico de 9 de Fevereiro de 2009

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